Para não dizerem que eu não gosto do Álvaro de Campos.
O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...
Álvaro de Campos
E, sim, sinto-me assim, cansado.
quarta-feira, fevereiro 06, 2008
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5 comentários:
Esse é um dos meus poemas favoritos do Álvaro de Campos, se é que consigo decidir-me por algum. Esse e o "Tabacaria".
o tabacaria também já foi referido por aqui :)
já somos dois, em relação ao álvaro de campos e ao cansaço.
Indirecta para mim? :)
O Campos é a minha paixão. Nem dá para escolher um poema. Só dá vontade de começar a ler e já não parar.
Também me parecia que andavas em "maré baixa". Volto a dizer-te que não há nada que o tempo não cure. E isto custa a ouvir ou a ler, eu sei, porque não faz absolutamente nada. É exactamente como se não te tivessem dito nada, eu sei. Mas qundo dói, tem de doer, não há outra maneira de passar por isso. Melhores dias virão, disso tenho a certeza. Enquanto não vêm, há que arrastar o nosso "luto", e ir passando os dias como se pode...
A Ema continua a ser a imbatível rainha dos comentários.
Quanto ao poema, recuso-me a ler poesias na web, em blogs, enfim, num ecran de computador. A poesia merece mais, merece livros, merece praia, merece sol, merece luz do dia e não a luz do monitor. Mas quando toca a Álvaro de Campos, a Caeiro, a Pessoa, enfim, a ti e ao teu cansaço... abro uma excepção e leio-te.
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